Criação de um órgão local do patrimônio divide opiniões
Diante do inchaço da máquina pública, proposta de criação de mais um órgão precisa ser amplamente discutida
De um lado, mais burocracia, maior custo aos cofres do Governo do Distrito Federal (GDF) e criação de um cabide de empregos. Do outro, a necessidade e efetividade da criação de mais um órgão na estrutura do GDF pode ser uma alternativa para o maior zelo com o patrimônio local, como defende a deputada distrital Arlete Sampaio (PT) ao sugerir a criação do Instituto Lúcio Costa. No entanto, a descrença com a efetividade da medida reforça a necessidade de maior discussão do tema.
Hoje o GDF possui 46 secretarias de Estado, 31 administrações regionais, além de 22 empresas públicas e fundações. O Instituto Lúcio Costa seria a 100ª estrutura do Executivo local. Ainda assim falta efetividade em quase todas as áreas de atuação do GDF.
Por ocasião da sessão solene da Câmara Legislativa em que a deputada apresentou a proposta, o secretário de Cultura, Hamilton Pereira (PT), destacou a importância do projeto de lei da distrital, mas manteve a cautela. “O projeto de lei de iniciativa da deputada Arlete Sampaio é fundamental e urgente. Ele aprofunda o debate sobre o tema, mas precisaremos discutir mais profundamente a questão e descobrir quais serão suas reais possibilidades e seus limites”, observou.
Foto: Dênio Simôes/Cedoc
Alfredo Gastal acha que deve-se reforçar estrutura existente
O professor da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Brasília, Cláudio Queiroz, é um entusiasta da iniciativa. “Eu fico até de certa maneira fascinado com essa proposta da deputada Arlete Sampaio que é muito imbuída de respeito e devoção pelas questões sociais da cidade”, destacou o professor.
Questionado sobre se a atuação da superintendência regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico no DF (Iphan-DF) não daria conta de tal empenho, ele reforça que os papéis desempenhados pelos dois órgãos, considerando-se a criação do Instituto Lúcio Costa, são concorrentes visto que a competência de zelar pelo patrimônio cultural é simultânea do GDF e do Governo Federal. “De fato o Iphan regional tem aqui uma superintendência, mas como em São Paulo, no Rio de Janeiro e nas principais cidades, existe, como existia em Brasília, o órgão local que acabou sendo reduzido a uma instância dentro da Secretaria de Cultura”, comentou o pesquisador.
Cláudio Queiroz foi o primeiro superintendente do Iphan-DF, regional que veio a reforçar a atuação do órgão federal em Brasília, antes atendida pela superintendência do Centro-Oeste centralizada em Goiânia. “O Iphan e sua regional trabalham de maneira muito mais ativa quando tem um órgão do governo local que dialoga e reforça as atitudes da superintendência regional, por isso acho de suma importância a proposta da deputada para termos um órgão que possa debater e dialogar com o Iphan dialetizando esse debate”, apontou.
Foto: Divulgação
Arlete Sampaio defende a criação do Instituto Lúcio Costa
O então superintendente regional do Iphan no DF, Alfredo Gastal, também apela para a cautela quanto à criação de um novo órgão. “Criar um instituto para cuidar do patrimônio histórico e cultural local quando a cidade é tombada nacionalmente é discutível, até porque a cidade já tem aquele título de patrimônio da humanidade, a cidade tem uma Secretaria de Cultura”, analisou.
Gastal, que deixou o Iphan na quinta-feira (6), chama a atenção para a expectativa criada acerca do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília, o PPCUB, pois se trata de uma lei que nem sequer foi aprovada e o Iphan não se pronunciou ainda a respeito dela. “Há que se discutir melhor a criação desse órgão visto que já tem vários órgãos que, teoricamente, se preocupam com Brasília, mas que inclusive a estrutura deles é pequena”, ressaltou.
Para Gastal, um exemplo de medida efetiva seria o caso de o Iphan e a área de proteção cultural do DF pudessem utilizar a Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis) para fiscalizar as questões de patrimônio local visto que são casos pontuais. Para ele, o maior problema não é falta de estruturas, mas é fazer com que elas funcionem efetivamente. Ele alerta que é preciso se preocupar também com a região metropolitana de Brasília que hoje cerca de 70% dos empregos formais. “A solução para preservar o patrimônio passa muito mais pelas questões sociais, do transporte público da periferia e da descentralização do emprego”, concluiu.
Distrital defende maior atuação do GDF
A deputada distrital Arlete Sampaio (PT) defende a criação de um Instituto do Patrimônio no Distrito Federal que seria denominado Instituto Lúcio Costa, em homenagem a um dos arquitetos que criou o projeto arquitetônico e urbanístico de Brasília. Na última semana, a deputada Arlete Sampaio (PT) também apresentou o Projeto de Lei nº 1079/2012, na Câmara Legislativa do DF, que objetiva incluir no calendário oficial de eventos e no calendário escolar do Distrito Federal o dia 17 de agosto como Dia do Patrimônio Cultural, além de instituir as Jornadas de Brasília Patrimônio Cultural da Humanidade, no período de 7 a 11 de dezembro.
Hoje, o órgão local que se dedica a essas questões é a Subsecretaria de Patrimônio, que funciona no âmbito da Secretaria de Estado da Cultura. Ao ser questionada se a criação de mais um órgão do Executivo local não seria um inchaço na estrutura do GDF, Arlete Sampaio esclarece que sua sugestão é que a estrutura da Subsecretaria de Patrimônio migre para o Instituto, não permitindo, com isso, a criação de cargos. “E por que Instituto? Para acompanhar o formato adotado pela maioria das instituições estaduais de preservação e para garantir mais agilidade administrativa e financeira e mais independência ao organismo local de patrimônio”, observou a deputada.
A parlamentar explica que o art. 23 da Constituição Federal estabelece que é responsabilidade comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios “proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos” e “impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural” (CF, art. 23, incisos III e IV). Mediante esse contexto legal, todas as esferas de poder têm a obrigação de proteger e manter seu patrimônio histórico, artístico, cultural, natural, paisagístico e arqueológico, material ou imaterial.
Ela acrescenta que, ainda de acordo com a CF e com a legislação pertinente, os bens materiais e imateriais de valor histórico, artístico, cultural, natural, paisagístico e arqueológico podem ser protegidos, mediante tombamento ou registro, em nível federal, estadual, municipal e, no caso de Brasília, distrital. Assim, a existência de um órgão local de preservação não se sobrepõe às funções do Instituto Histórico e Artístico Nacional, que possui uma superintendência no DF responsável por cuidar dos bens do DF que são objeto de tombamento ou registro federal. “Se não houvesse um organismo local de proteção, hoje representado pela Subsecretaria de Patrimônio da Secretaria de Cultura, muitos testemunhos de nossa história e de nossa cultura não estariam sob o manto do tombamento ou do registro, como, por exemplo, a Vila Planalto, o Boi do Seu Teodoro, o Festival de Cinema de Brasília, o Clube do Choro etc”, concluiu.
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