Vieram para ficar
Depois de adotarem Brasília como lar, Manuel e Natividade Pires já planejam uma nova rede de restaurantes por aqui
O casal 20 da boa mesa: eles zelam por dois dos melhores endereços da cidade (Foto: Michael Melo)
Em 2011, o restaurateur português Manuel Pires, mais conhecido por Manuelzinho, chegou a Brasília para passar apenas dois meses na cidade. Sua missão era específica: inaugurar uma filial do Antiquarius Grill, famosa grife carioca de alta gastronomia, no Espaço Gourmet do ParkShopping. “Fui ficando mais alguns meses, virou um ano, dois, e agora não quero mais sair”, diz o empresário, de 60 anos. Ainda residindo em um hotel, ele e a esposa, Natividade Pires, adotaram a capital federal como lar definitivo. Neste ano, eles não só procuram uma casa para morar e trazer a mudança completa do Rio de Janeiro, como planejam expandir os negócios por aqui.
A proposta, segundo Manuelzinho, é criar uma rede de três ou quatro restaurantes a quilo, em moldes semelhantes ao do carioca Da Silva, outro filhote do clássico Antiquarius (veja o quadro abaixo). Natividade deve assumir essa aventura. Ela tomou gosto pelo ramo do marido, com quem está casada há 37 anos, depois de chegar a Brasília. Sem conhecer muita gente por aqui e com a família distante, sentiu necessidade de se dedicar a uma iniciativa para espantar o tédio. “Queria fazer algo sozinha. Até que surgiu a oportunidade de abrir meu próprio restaurante”, afirma a empresária, de 58 anos, referindo-se ao renovado e promissor Dalí Camões, no Brasil 21. O espaço incorporou, com ótimos resultados, parte do menu do Antiquarius Grill.
No berço da alta cozinha nacional
A marca carioca determinou a trajetória de sucesso do alentejano
Se o Piantella, nascido em 1976, foi um pilar do conceito de alta gastronomia em Brasília, o Antiquarius, criado no mesmo período, também pode ser apontado pelo mesmo feito em solo carioca. A tradicional casa portuguesa antecedeu o boom de restaurantes de sotaque europeu, predominantemente franceses, que marcou o Rio de Janeiro nas décadas seguintes. Essa grife da boa mesa chegou ao Brasil transferida da Pousada Santa Luzia, mantida pelo empresário português Carlos Perico em sua terra natal, mais especificamente na cidade de Elvas, região do Alentejo. Lá, aos 11 anos, Manuel Pires, o Manuelzinho, começou uma vitoriosa carreira profissional, que transformou o carregador de malas alentejano em sócio no grupo de Perico. Ao todo, já são 49 anos dedicados à marca. “Trabalhei no bar, depois como garçom, chefe de fila (coordenador da equipe de atendentes), até virar maître do Antiquarius, já no Rio, e, então, dono”, lembra o empresário. Momento decisivo em sua trajetória de vida, a transferência além-mar ocorreu em 1977, quando Perico atendeu a um convite de Carlos Lacerda, ex-governador do extinto Estado da Guanabara, para abrir um empreendimento no bairro do Leblon. Menos de duas décadas depois, o braço-direito de Perico entrou para a sociedade. Em 1990, Manuelzinho ajudou a fundar a segunda unidade do Antiquarius, em São Paulo, que encerrou as atividades no ano de 2012. Na sequência, ele criou um novo ramo da empresa, o Antiquarius Grill. A primeira unidade chegou em 2007 ao Barra Shopping, no Rio, com ares mais modernos que os da casa-mãe e um cardápio eclético. O alentejano também foi responsável por levar a marca para fora do eixo Rio-São Paulo. Em novembro de 2011, com o surgimento do Espaço Gourmet do ParkShopping, Manuelzinho desembarcou na capital federal para inaugurar a versão brasiliense da grife gastronômica. “Demorou um pouco para o público assimilar a ideia de restaurantes de alto padrão dentro de shopping centers, mas agora está dando certo”, comemora.
O restaurateur no Antiquarius do Rio de Janeiro, em 1987: o maître se tornou sócio (Foto: Guilherme Pinto / Agência o Globo)
Embora esteja à frente da futura empreitada, Natividade quer o experiente Manuelzinho como sócio. No menu, ainda em elaboração, as especialidades das duas casas já existentes ganham versões para self-service. O aparador deve exibir, naturalmente, clássicos portugueses, como arroz de pato e algumas fórmulas de bacalhau, caso da versão espiritual, com lascas do peixe salgado em um creme de ovos e gratinado com queijo. Para incrementar a oferta, um prato brasileiro será servido diariamente. Pode ser, por exemplo, uma rabada (com receita da própria Natividade), dobradinha ou feijoada. A empresária ainda procura um bom ponto para abrir o estabelecimento, talvez num shopping. Definido isso, a ideia é correr com o projeto para inaugurá-lo antes da Copa do Mundo, em junho.
A decisão de ampliar os negócios coincide com o momento em que o emergente casal 20 da gastronomia brasiliense se sente mais acolhido pela cidade. Quando chegaram, eles tinham saudade do mundo em que viveram por quase quarenta anos. “No Rio, eu me acostumei a conhecer todos os clientes do restaurante. Aqui, de repente, deparei com estranhos”, afirma o empresário. Aos poucos, porém, começaram a aparecer alguns cariocas, antigos fregueses cativos, e muitos novos amigos. Entre os habitués da capital está o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto. “Ele é vegetariano, então substituímos o cordeiro por ‘costeletas’ de espinafre com amêndoa”, conta o restaurateur, que ainda se adapta à troca de uma assídua clientela de artistas e celebridades do esporte por autoridades e muitos políticos.
Agora mais aclimatados a Brasília, Manuelzinho e Natividade costumam aproveitar os fins de semana de folga para passear de lancha pelo Lago Paranoá. Eles também gostam de circular por pontos turísticos como a Esplanada dos Ministérios, o Palácio do Planalto e o Catetinho. Apreciam, sobretudo, o trânsito bem mais tranquilo do que o da capital fluminense. “Quando visito o Rio, fico um dia e já quero vir para cá novamente”, afirma o empresário.
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