W3 Sul: de principal rua de comércio de Brasília a sinônimo de abandono
Até meados da década de 1980, a avenida era uma área glamourosa da Capital Federal e o principal centro de comércio. Hoje é sinônimo de decadência com calçadas deterioradas, fachadas mal preservada, falta de segurança e muita sujeira
Foto: Sheyla Leal/ObritoNews/Fato Online
O comércio da W3 sofre com o abandono da avenida
A cada governo, a W3 Sul se distancia mais das alcunhas de Oscar Freire ou mesmo Champs-Élysées brasiliense. Não é exagero: até meados da década de 1980, a avenida era, de fato, uma área glamourosa da Capital Federal. Funcionava como um efervescente shopping a céu aberto, mais movimentado do que muita feira popular.
Hoje, a W3 é sinônimo de abandono, sem ressalvas. Quem (ainda) não fechou as portas vive do saudosismo e dos clientes cativos. Cada mês é um tormento para pagar o aluguel, cujo valor, apesar do marasmo na avenida, não para de subir.
Quando a ideia do metrô surgiu em Brasília, cogitou-se construir estações ao longo da W3, mas elas acabaram migrando para os eixos. “Foi uma das piores decisões que já tomaram nesta cidade”, avalia Frederico Flósculo, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB (Universidade de Brasília).
De lá para cá, a W3 só acumulou problemas: calçadas e marquises deterioradas, fachadas mal preservadas, escassez de estacionamento, falta de segurança e de iluminação, sujeira e tantos outros descuidos que foram afastando a população ao longo dos anos.
Avenida fantasma
Com um potencial incontestável, a W3 conseguiu se transformar em uma avenida fantasma. Ao percorrê-la na última semana, a reportagem do Fato Online encontrou o vendedor Darci Maciel, 62 anos, cochilando no interior de uma loja de móveis para escritório na 513 Sul. “Aqui é um sossego só”, justificou. Era fim de tarde e ele havia vendido uma única cadeira naquele dia.
Quem faz companhia para Darci são as ratazanas que vez ou outra cruzam a calçada. “Quanto mais empresários vão embora, mais os clientes desaparecem: é um ciclo muito ruim para o comércio”, comenta.
Cada governo eleito pelo povo promete revitalizar a W3, uma das principais avenidas do DF e certamente a mais cheia de histórias e simbolismos. Os discursos quase sempre são envolventes, mas, no fim da história, nada é feito de concreto. “É mais fácil eu sair daqui do que essa tal revitalização acontecer”, lamenta Raimundo Alves, 69 anos, dono do salão mais tradicional da W3. Mesmo contando com a ajuda de clientes fiéis, ele e os irmãos – sócios no negócio – planejam “encerrar a carreira” em, no máximo, dois anos. “Antes, isso aqui era animada. Hoje, todo mundo só vive cabisbaixo na W3”, resume.
Sem novos clientes – porque simplesmente não há movimento na avenida –, seu Raimundo diz que só consegue fechar as contas do mês “graças a Deus”. À ajuda de divina ele também credita o fato de nunca ter sido assaltado, ao contrário dos vizinhos. “Mesmo assim, para evitar problema, estou fechando às 18h. Antes, ficava aberto até as 20h”, conta.
Decadência
Em 2002, ou seja, 13 anos atrás, o governo local realizou um concurso para escolher o projeto de revitalização mais adequado para a W3. A proposta vencedora nunca saiu do papel. “Aqui, a única coisa certa mesmo é a decadência”, diz, quase em tom de revolta, Tony Cruz, 51 anos, dono de uma loja de acessórios para construção na 514 Sul, inaugurada em 1983. Ele é um dos que pensa em sair da W3 nos próximos meses. “Nunca mais vai voltar a ser o que era”, afirma ele, sem esperança de que o atual governo fará algo concreto para melhorar a avenida. Em cinco anos, o preço do aluguel pago por Tony dobrou, e o número de funcionários despencou de 12 para quatro. “Há três meses, não preciso repor o estoque”, revela.
Uacy Silva, 72 anos, um dos veteranos da W3, diz que o governo erra estrategicamente ao não revitalizar a avenida. “Eles não devem saber que se as coisas melhorassem por aqui, a arrecadação subiria e todo mundo sairia ganhando”, ironiza o comerciante, dono de uma loja de máquinas antigas. “A W3 foi rejeitada pelo poder público. É muita promessa e ninguém faz nada”, acrescenta Uacy, que chegou à avenida em 1976.
Insegurança
Recém-chegado à W3, Fábio Barros, 28 anos, dono de um estúdio de tatuagem na avenida, prefere acreditar na revitalização. “A gente sabe que a situação já foi muito melhor, mas escolhemos a W3 por ser um lugar histórico. Apostamos nisso aqui”, explica o empresário. Mas, enquanto as promessas de mais segurança não vêm, por exemplo, Fábio manda instalar alarmes e reforça as trancas da porta. O estabelecimento já foi assaltado duas vezes. “A gente trabalha um pouco com medo, mas gostamos do lugar”, insiste.
A aposentada Arcanja Cordeiro, 63 anos, mora em uma casa virada para a W3 Sul desde a década de 1980. Ela recorda que “tudo se resolvia por ali”, sem a necessidade de encarar o trânsito para comprar o que quer que seja. “Hoje, não tem mais nada. Nem lembro a última vez em que fiz alguma compra na avenida”, sublinha. “Toda hora as lojas mudam de fachada”, acrescenta a autônoma Ana Carolina Cordeiro, 33, filha de dona Arcanja. “Se a W3 fosse revitalizada mesmo, as casas das quadras 700 seria valorizadas”, vislumbra.
Foto: Sheyla Leal/ObritoNews/Fato Online
Lojas fechadas mostram a queda do comércio da W3
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