Piscinão do Lago Norte: sem-piscinas transformam área nobre em praia
Um descampado que virou prainha é frequentado há 15 anos por famílias cujos salários mensais sequer chegam perto do valor do metro quadro das mansões dos arredores
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O Piscinão do Lago Norte se encaixa em todos os clichês de lugares onde a apatia do Estado abre brechas para que o povo se divirta como pode. Localizado às margens da EPPR (Estrada Parque Paranoá), entres as quadras ML 5 e 7, um descampado que virou prainha é frequentado há 15 anos por famílias cujos salários mensais sequer encostam no valor do metro quadrado das mansões dos arredores.
“O governo não arruma isso aqui porque vê que só tem pobre. Se tivesse rico tomando banho aí no Lago (Paranoá), estava tudo chique igual ao Pontão e à Ermida”, dispara Vilma Julião, 30 anos, dona de uma das cinco barracas fixas do espaço.
Com frequência, Vilma e os colegas escutam que os vizinhos do piscinão não gostam da presença de mais de 1 mil pessoas ali todo fim de semana – quando faz muito calor, esse número chega a dobrar.
“Povão por perto”
“Os barões dizem que nossa prainha desvaloriza os imóveis deles. Mas você sabe, né? A verdade é que rico não gosta de povão por perto”, diz Mauro Bezerra da Silva, 42 anos, o primeiro a começar a vender comidas e bebidas no local, em 1999.
O presidente da Associação dos Moradores do Lago Norte, Fernando Varanda, acredita que o principal problema do piscinão seja o barulho, já que alguns visitantes ligam o som do carro nas alturas. “É possível escutar as músicas do outro lado do lago, nas QLs”, sublinha.
Para Varanda, além de banheiros, estacionamentos e posto de salva-vidas, faltam organização e disciplina no potencial balneário do Lago Norte. Sobre o público que frequenta o espaço, ele define: “É o pessoal que não tem piscina.”
Promessas vazias
Quem trabalha no local está cansado das promessas de políticos em época de campanha eleitoral. Projetos para melhorar o piscinão tem de sobra, mas nada de concretizá-los.
“Nós estamos fazendo a nossa parte. E o governo?”, cobra Mauro. Ele os demais comerciantes pagam, atualmente, R$ 557 por mês para o GDF por uso de área pública. Sonham com o retorno desse dinheiro em forma de quiosques. Hoje, eles transformam em comércio kombis e trailers antigos.
A Secretaria de Turismo do DF informou ainda não saber se o piscinão integrará o Projeto Orla, uma das bandeiras do governador Rodrigo Rollemberg. Já a Administração do Lago Norte disse que encaminhou à Segeth (Secretaria de Gestão do Território e Habitação) mais um projeto de melhorias do espaço, ainda a ser apreciado pela Casa Civil. Ou seja, salvo uma reviravolta, a prainha ainda seguirá sem infraestrutura adequada por um bom tempo.
A maior parte dos frequentadores do piscinão – que a Administração prefere chamar de “Mirante Norte” – mora em cidades como Paranoá, Itapoã e Varjão. Encontrar famílias do próprio Lago Norte é missão quase impossível.
Novela
Em 2002, quando uma novela da Rede Globo apresentou ao país o Piscinão de Ramos, no bairro da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, o então administrador do Lago Norte, Marco Lima, empolgou-se com a ideia do Piscinão do Lago Norte. O mato foi aparado, e teve até festa com direito a trio elétrico. “Ele [Marco Lima] diz que criou isso aqui. Mas fui eu. Cheguei antes dele”, polemiza Mauro Bezerra, o comerciante veterano.
Com o bordão “cada mergulho é um flash”, da atriz Mara Manzan, a novela foi um sucesso. Na vida real, a proposta do administrador, impulsionada por estratégias políticas, não se sustentou, e a prainha do Lago Norte continuou ao deus-dará.
Na época do governador José Roberto Arruda, pareceu que sairia do papel um plano que previa areia fina, coqueiros, calçadão, quadra de futevôlei e quiosques. A ideia custaria R$ 20 milhões e ficaria pronta para os 50 anos de Brasília, em 2010. O governo acabou antes disso, e a proposta, de novo, escorreu pelo ralo.
Cinco anos atrás, o então candidato ao Senado Rodrigo Rollemberg, agora governador do DF, visitou o local e ressaltou a importância de democratizar o acesso ao Lago, "oferecendo infraestrutura para que a população possa aproveitar o espaço com conforto e segurança", como disse à época.
Ponto turístico
Os frequentadores torcem para que, mesmo após tantas promessas não cumpridas, o Piscinão do Lago Norte ganhe, enfim, atenção digna de ponto turístico.
“Já que não tem praia, é aqui mesmo. O lugar é lindo, a água, ao contrário do que muita gente pensa, é limpa. Se o governo arrumasse, ficaria excelente”, comenta Sidney Pereira, 40 anos, morador da Estrutural, que duas vezes por mês leva a mulher, os três filhos e o cachorro Scooby para um churrasco às margens do Lago.
“Aqui é point. Virou tradição de domingo. Mas fica claro que falta mais cuidado”, acrescenta Cleison Freitas Ribeiro, 32, morador do Paranoá, enquanto degusta um vinho Cantina da Serra ao lado da família. A melhoria na estrutura, alerta ele, deverá ser acompanhada de aumento na segurança. “É comum ver gente usando drogas aqui. E quando alguns exageram na bebida, tem confusão”, conta.
Foto: Beto Barata/ Fato Online
O piscinão está localizado em uma área nobre do Lago Norte
Foto: Beto Barata/ Fato Online
http://fatoonline.com.br/conteudo/44...a&p=de&i=1&v=1