Projeto precisa ser parte do plano de mobilidade urbana
O objetivo da obra é resolver o problema da falta de vagas e incentivar a integração com o transporte público no Distrito Federal
LEA QUEIROZ - Redação Jornal da Comunidade
O estacionamento irá abranger o gramado entre a rodoviária e o Congresso Nacional
A construção de estacionamentos subterrâneos na Esplanada dos Ministérios suscitou novas discussões acerca da proposta do Governo do Distrito Federal para resolver o problema de mobilidade urbana. Para especialistas, o projeto é viável desde que faça parte de um plano que contemple a solução do problema da falta de vagas de estacionamento e amplie ações que incentivem o uso do transporte público.
A primeira impressão é de que a proposta venha a incentivar o uso do automóvel, contrariando as políticas de transporte e mobilidade modernas que apregoam o “desincentivo” ao veículo particular.
O engenheiro de tráfego Paulo César Marques observa que é preciso solucionar o problema de estacionamento e isso não quer dizer ir na contramão da tendência moderna de não estimular o uso do automóvel. Ele destaca que o problema é quando se limita as ações, o que acaba atraindo esse incentivo indesejável. “Tem que ser parte de um planejamento que acomode as demandas, ou seja, que tire os carros das ruas, mas também resolva um problema que existe de fato. Agora, se for para criar mais facilidade para andar de automóvel, é ruim porque estamos apostando num modelo que só vai piorar, só vai saturar”, esclarece.
O professor de pós-graduação em transportes da Universidade de Brasília, Joaquim Aragão, reforça que faz parte da política de mobilidade a introdução do estacionamento pago numa iniciativa para racionalizar o espaço urbano e limitar o seu uso. “Se você não introduzir o estacionamento pago, o espaço é utilizado de forma ineficiente e as pessoas, não encontram vaga e acabam tendo que usar táxis”, comenta.
Ele observa que as pessoas que necessitam de estacionamento para o dia inteiro, por exemplo, poderiam estacionar mais longe e aí também é preciso incentivar o uso do transporte coletivo. “Tem que melhorar o transporte coletivo, adequar o sistema viário e introduzir uma política de estacionamento, entre outras ações, pois é preciso uma política integrada. Uma obra pela obra realmente não melhora, principalmente um estacionamento subterrâneo, que é caro”, argumenta Aragão. Ele questiona que é preciso, no entanto, ver qual será a tarifa de equilíbrio desse investimento, pois se for alta, as pessoas irão fugir do estacionamento. Se ele ficar vazio, não compensa o investimento.
Aragão acrescenta que se o uso for destinado a vagas de curta duração, isso não viabiliza o empreendimento. “Então, em princípio, é para as pessoas que usam o estacionamento em maior duração, enquanto o estacionamento de superfície é para quem irá parar por menos tempo”, avalia.
Para o estudioso, o projeto de construção dos estacionamentos subterrâneos é positivo, mas é necessário observar se ocorrerá e se fará parte de uma ação dentro de um projeto maior de mobilidade urbana.
Proposta une interesses
Na última semana, o governador Agnelo Queiroz decretou a constituição de um grupo de trabalho para subsidiar a elaboração dos projetos de construção dos estacionamentos subterrâneos na Esplanada dos Ministérios, entre outras providências (DODF 27/02/12). O decreto aponta o interesse comum do DF, do Congresso Nacional e da União na construção dos estacionamentos e destaca a necessidade de realização dos estudos de viabilidade e modelagem de parcerias público-privadas para a construção e a gestão dos estacionamentos subterrâneos.
O grupo de trabalho será coordenado pela Secretaria de Estado de Governo e também terá representantes do Senado Federal, Câmara dos Deputados e Secretaria de Patrimônio da União. Cada órgão indicará dois representantes e depois de sua efetiva constituição, o grupo terá o prazo de 30 dias para o término dos trabalhos.
Os estacionamentos subterrâneos irão abranger todo o gramado central entre a rodoviária e o Congresso Nacional, e contará com comércios específicos. Segundo o GDF, embora pareça incentivar o uso do automóvel, na verdade a iniciativa visa estimular o transporte coletivo, uma vez que o estacionamento subterrâneo estaria integrado a transportes coletivos.
O projeto será executado por parceria público-privada, sem aporte de recursos do governo e a empresa responsável pela obra vai explorar o estacionamento pago.
Ciclistas discordam da iniciativa
Os integrantes da Organização não Governamental Rodas da Paz acreditam que a cons-
trução dos estacionamentos subterrâneos na Esplanada de Ministérios vai estimular o uso do transporte particular e consideram a proposta um “símbolo de um projeto de cidade onde não há atenção ao planejamento sustentável de médio e logo prazo”.
O presidente da OnG, Uirá Felipe Lourenço, considera o projeto um contra-senso diante das políticas modernas de transporte e mobilidade que tendem a priorizar, no mundo todo, o transporte público, o pedestre e as bicicletas.
O grupo de ciclistas tem se mobilizado para manifestar sua contrariedade. Inicialmente lançaram um manifesto na internet com abaixo-assinado intitulado “NÃO à construção de estacionamentos subterrâneos na Esplanada dos Ministérios!”. No entanto, a proposta não deu certo. Mas o grupo não desistiu e entregou, há um mês, uma carta ao governador Agnelo Queiroz na qual manifesta a preocupação com o aumento do número de vagas que pode agravar o problema do trânsito em Brasília e atrair também sérias consequências ambientais, sociais e econômicas. “É inadmissível gastar milhões de reais dos cofres públicos para estimular o transporte particular enquanto o transporte público e a estrutura para pedestres e bicicletas permanecem em condição lamentável.”
Uirá Lourenço reforça ser preciso ao governo ter uma diretriz clara para a política de transporte e mobilidade que hoje se apresenta contraditória. “Não adianta o governo instituir as vias exclusivas para os ônibus e anunciar vagas de garagem para carros particulares. Temos dialogado com o governo sobre a necessidade de repensar o modelo de transporte integrado de forma a haver um desincentivo ao uso de carros”, manifesta.
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